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«Não sou crítico da família política do atual governo, mas das famílias da política no atual governo!»

«Não sou crítico da família política do atual governo, mas das famílias da política no atual governo!»

Dadas as dezenas de solicitações que temos recebido e o período de emergência que atravessamos, a administração do Jornal Maia Hoje decidiu publicar online a entrevista, de interesse nacional, exclusiva, que nos foi concedida pelo professor doutor Pedro Caetano.

Pedro Caetano, cientista português em Oxford (Reino Unido) é certificado em Fármaco-Epidemiologia respetivamente pelas Universidades de Michigan (EUA), Ohio State (EUA), Harvard (EUA) e ainda pela London School of Hygiene and Tropical Medicine (Reino Unido).
Exercendo actualmente o cargo de Diretor global de indústria farmacêutica em Oxford, é ainda doutorado em Farmacologia, doutorado em Farmácia Clínica, Mestre em Saúde Pública e ex-professor de Epidemiologia e Farmacologia na Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Nova de Lisboa.
Politicamente não esconde ser socialista e ex-membro da comissão de estudo de melhoramento do Serviço Nacional de saúde (SNS) do PS de António José Seguro.
Em grande entrevista concedida pela segunda vez ao MaiaHoje, fala da actualidade, do futuro e das medidas tomadas em Portugal.

Maia Hoje (MH): A temática das vacinas é bastante complexa, envolve as mais diversas vertentes como por exemplo o número de testes efectivos ou mesmo a logística de transporte. No entanto acho que será consensual explicar bem o que está em jogo e para quando certezas.
Desta forma gostaria de começar por questionar se, além das tão faladas vacinas, não deveriam estar também a serem estudadas soluções para o tratamento, ou seja, para travar a progressão da doença e mesmo para uma recuperação mais rápida?

Pedro Caetano (PC): Estão a ser estudas soluções para o tratamento e há pelo menos um medicamento, o Remdesivir aprovado recentemente precisamente para permitir uma recuperação mais rápida.
A prioridade dos governos mais ricos do mundo foi investir no desenvolvimento de vacinas em parceria com a indústria farmacêutica. Isto porque estas são uma solução mais definitiva que, sendo bem-sucedida, vai erradicar largamente a doença. Ora, isto a médio prazo torna os medicamentos menos necessários, logo menos atrativos para investir dinheiro e tempo na sua investigação. É isso também que explica, em parte, que em vez de novos medicamentos desenvolvidos especificamente para o SARS-Cov-2, se estejam a estudar principalmente medicamentos que já tinham sido desenvolvidos para combater outros vírus ou outras doenças que possam ser aprovados a médio prazo para esta nova indicação da Covid-19. Não se estão a desenvolver muitos medicamentos, especificamente desenhados para terem este vírus como alvo, porque isso levaria mais tempo e quando chegarem ao mercado podem ser pouco necessários.

MH: Há actualmente algo mais que “Ben-u-ron” para o “tratamento” da doença? A tão famosa Hidroxicloroquina é 100% eficaz como o dizem alguns políticos?

PC: Para a maior parte dos doentes não hospitalizados, moderados e sem grandes fatores de risco de facto não há muito mais neste momento que tratamentos comuns para os sintomas. O conselho de vários serviços de saúde, de vários países, para doentes não hospitalizados e sem sintomas graves é realmente mesmo só o Paracetamol.
No entanto, para os doentes hospitalizados há um medicamento aprovado para o tratamento da Covid-19, nomeadamente o Remdesivir, aprovado definitivamente a 22 de Outubro, pela Agência Americana do Medicamento (FDA), depois do primeiro ter sido aprovado para uso de emergência logo no mês de maio. Este medicamento provou, através de três ensaios clínicos com cerca de 2000 doentes hospitalizados, ser relativamente seguro, reduzindo o tempo de recuperação de 15 para 10 dias.
Estão também aprovados pela FDA, por enquanto só para uso de emergência, o plasma de pessoas infectadas com o vírus e que produziram anticorpos, que pode ser usado em doentes em perigo de vida por Covid-19; o Bamlanivimab da farmacêutica Lilly que é um anticorpo monoclonal que impede o vírus de se ligar a células humanas e que pode ser usado em doentes em riscos de progredir para doença severa ou hospitalização, tendo já demonstrado que faz descer essa progressão de 10% em placebo para apenas 3% com o medicamento. Existem ainda o Regiocit e o Fresenius Kabi Propoven 2%, que são soluções úteis para doentes com problemas renais e respiratórios severos, respetivamente, devido à Covid-19.
Quanto a esses políticos, assumindo que se refere quer ao presidente brasileiro Bolsonaro quer ao ainda presidente americano Trump, penso que hoje já nem eles acreditam na Hidroxicloroquina. Existiram, de facto, inicialmente alguns estudos preliminares que sugeriam que esse medicamento antimalárico podia ter alguma eficácia, e isso levou a aprovação pela FDA, para uso de emergência, logo em Março, quando ainda não havia mais nenhuma alternativa terapêutica. No entanto, depois, em Junho, um estudo mais robusto, com 800 doentes, publicado na melhor revista medica americana (New England Jornal) indicou que o medicamento não era eficaz e tinha mais efeitos adversos que o placebo, pelo que a FDA retirou logo aí a aprovação de uso de emergência.
Entretanto, o próprio presidente Trump, quando ficou infectado com SARS-Cov-2, foi tratado com os medicamentos, aprovados acima referidos: Remedesivir, anticorpos monoclonais e plasma de convalescentes.
Outros políticos também disseram disparates terapêuticos ou cometeram erros em entrevistas, mas foram poupados a críticas. Por exemplo, o nosso primeiro-ministro disse que os antibióticos curavam o vírus, ora é básico que estes são contra bactérias.

MH: Voltando à vacina, já perdemos a conta às vacinas em desenvolvimento, mas fala-se em duas mais “interessantes”, a da Pfizer e a da Moderna, mas há também outras como as Russas e as Chinesas que parecem estar avançadas. Neste contexto a população teme que também haja aqui algo de “propaganda médica”. Tem algum fundamento?

PC: Felizmente, há de facto muitas vacinas em desenvolvimento. À data de 18 de Novembro, havia 54 vacinas a serem estudadas já em humanos (fase clínica) e mais outras 87 a serem estudadas em animais (fase pré-clínica). Portanto, mais que propaganda, há de facto um esforço enorme, conjunto da indústria farmacêutica e seus investidores, das universidades e de vários governos para testar e produzir vacinas rapidamente. Por exemplo, nunca dantes se tinham recrutado tão rapidamente doentes em tantos ensaios.
As vacinas mais avançadas contam-se pelos dedos de uma mão, mas as mais avançadas em termos de dados de fase 3 são mesmo as da Pfizer e Moderna, que tem dados, cada uma, em cerca de 40000 voluntários, com perto de 100 casos de covid detetados, sendo a maioria no grupo que tomou placebo (solução salina a imitar em aspeto a vacina ativa), portanto, sugerindo fortemente que a vacina é eficaz (embora só quando chegarmos aos 150 casos podem os dados de eficácia servirem para aprovação).
No mundo ocidental, os requerimentos de segurança e eficácia quer da agência americana, quer da agência europeia do medicamento são maiores, pelo que, apesar de serem as duas mais avançadas, não estão ainda aprovadas mesmo com todos estes dados.
A sua aprovação vai ser só para emergência, pois ainda temos apenas cerca de dois meses de dados de segurança (idealmente devíamos ter um ano) e não sabemos quanto tempo dura a sua eficácia.
A vacina da Moderna parece ser ligeiramente mais eficaz e ter necessidade de menos refrigeração (20 graus negativos em vez de 70 graus negativos), mas até agora tudo sugere que serão ambas excelentes vacinas. Os voluntários vão continuar a ser seguidos para termos mais dados.
Há também duas vacinas russas aprovadas, a Sputnik V, do Instituto Gamaleya, e a Bektop, do Instituto Vector, mas essa aprovação sim, trata-se de propaganda política em vez de médica, pois na realidade essas vacinas estão mais atrasadas que as americanas, em fase 3, que ainda não chegou a tantos voluntários nem casos.
Curiosamente, a Rússia parece estar tão apostada em propaganda que, além da aprovação precoce das suas vacinas, também aproveita para insinuar nos canais da sua TV que a vacina inglesa, da Universidade de Oxford e companhia Astra-Zeneca (que em breve também poderá ter resultados de fase 3, com dados de segurança mais robustos que os dos russos), pode ter efeitos secundários relacionados com “macacos”, apenas porque o vírus inativado que este programa tem é proveniente de macacos.
Penso que, pelo mundo inteiro, é obvio que há demasiada propaganda política em vez de científica na Rússia, apesar de as suas vacinas poderem revelar-se, de facto, também seguras e eficazes quando houver dados suficientes.
A China está melhor posicionada que a Rússia nesta “corrida”, pois pouco se fala, mas a Fosun é o parceiro chinês da Pfizer e da Biontech (companhia alemã que desenvolveu inicialmente a vacina para a Pfizer).
Além disso, a China tem duas vacinas aprovadas para uso limitado internamente, a CanSino (para uso em militares), e a CoronVac da companhia Sinovac (para emergências) e mais outra a Sinopharm, aprovada nos Emirados Árabes Unidos. No entanto, todas estas vacinas estão também em fase 3 e ainda não se conhecem os resultados, embora sejam as mais prováveis de serem também aprovadas e adquiridas por vários países em desenvolvimento, incluindo o Brasil que já manifestou essa intenção.

MH: No seu entender, o que o nosso governo e mesmo a União Europeia, deve levar em conta ao fazer uma escolha?

PC: Os aspectos principais ao escolher uma vacina e um medicamento devem ser sempre a segurança, eficácia e qualidade. Depois, obviamente porque os recursos financeiros para a saúde são finitos, o custo também é um fator importante.
Neste caso específico, porque vai ser necessário vacinar 65% da população o mais rapidamente possível (para se poder atingir a imunidade de grupo), a distribuição, nomeadamente a cadeia de transporte e refrigeração, também vai ser algo muito importante a ter em conta.
Passando a detalhar. Sobre segurança: inicialmente, quando as vacinas forem aprovadas para uso de emergência, de preferência ainda antes do final deste ano, vão haver dados sobre os efeitos adversos apenas nos dois primeiros meses. Isso assegura-nos, mas obviamente que, quanto mais tempo os voluntários dos ensaios de fase 3 continuarem a ser seguidos e mais pessoas usarem a vacina uma vez no mercado, mais dados de segurança a médio e longo prazo teremos. Idealmente deveríamos ter 6 meses a 1 ano, mas 2 meses já são bastante asseguradores, pois cobrem as reações mais perigosas que são normalmente as iniciais.
Em relação à eficácia, também é importante continuar a seguir os voluntários da fase 3 para ver qual a duração da eficácia. Pode-se dar o caso de ser demasiado curta numa vacina em relação a outra e então obviamente, a que tiver maior duração de eficácia, deve ser escolhida. Também aquela que for mais eficaz nos idosos e outros grupos de maior risco como as pessoas com obesidade ou diabetes, deve ser preferida.
Quanto à qualidade também é preciso garantir que há consistência e reprodutibilidade nos lotes das vacinas, mas isso normalmente é algo que as agências de medicamentos asseguram antes da aprovação pelo que não deve ser uma preocupação muito grande para o governo.
O custo para já também já está negociado pela UE e ronda os 20 euros por dose das duas primeiras vacinas, com tecnologia avançada de mRNA, mas poderá ser de apenas 10 euros para outras vacinas como a da Johnson & Johnson.
A preocupação principal deve ser até que ponto a cadeia de distribuição pode ser complicada, por factores como a refrigeração da Pfizer, a exigir menos 70 graus negativos versus a vacina da Moderna, a exigir apenas 20 graus negativos.
Não adianta ter a melhor vacina do mundo se depois não se consegue distribuir nem existem meios no país para a conservar activa e com qualidade.
Sabendo que isto é uma potencial desvantagem em relação aos competidores, a Pfizer está a fazer um esforço grande para ajudar a União Europeia neste aspecto, tendo já montado, na Bélgica, um centro de armazenamento refrigerado do tamanho de um estádio de futebol e estudado o tipo de aviões que podem transportar enormes quantidades à temperatura requerida.
A simplicidade da injeção e do espaço de tempo entre a administração das duas doses também deve ser tomada em conta para que se possa vacinar o maior número de pessoas o mais rapidamente possível.

MH: A poder apontar um prazo para a “massificação” da vacinação, pelo menos aos de maior risco, quando acha que será? E em Portugal?

PC: O Governo português infelizmente não se preparou atempadamente para o cenário que eu até aqui no vosso jornal da Maia já tinha previsto, mas também na TVI e Porto Canal, que poderia haver uma vacina antes do final do ano.
Por isso não tem um plano de vacinação definido e ainda nem sequer tem formalmente constituída a comissão técnica de vacinação contra a Covid-19, que o primeiro ministro anunciou, após conhecer os resultados da vacina, em vez de meses antes como vários outros governos o fizeram, sendo suposto definir o plano juntamente com a DGS.
Da DGS não se sabe sequer se planeiam e como planeiam envolver centros de saúde e/ou hospitais, ou como estão a prever a complexa refrigeração necessária. Não apresentaram plano nenhum, porque provavelmente não tem ainda plano nenhum.
Para responder à sua pergunta, só posso fazer uma extrapolação dos tempos, adiantados pelos muitos governos, que ao contrario do nosso, se preparam e se preveniram para esta eventualidade de ter a vacina no final do ano, tendo por exemplo, como o governo inglês fez, nomeado a comissão e liderança desde Maio, apresentando um planos com táticas e objetivos muito concretos, que envolvem o uso do exército na distribuição refrigerada e de 1000 centros de saúde a operarem 12 horas por dia, 7 dias por semana, para conseguirem vacinar cerca de 6% da população por mês.
Penso que em Portugal, uma vez que o governo não tem ainda plano nenhum, a não ser a sorte da União Europeia ter assegurada a compra das vacinas, 460 milhões de doses só da Moderna e da Pfizer (e mais centenas de milhões de doses doutras vacinas), o ritmo de distribuição, especialmente neste inicio em que parte atrasado, não será tão rápido como 6% da população vacinada por mês.
Os governos alemães ou espanhóis também tem planos avançados, que o português não tem.
Mesmo assumindo um número generoso para o nosso governo, de que conseguirá vacinar 5% da população, ou meio milhão de pessoas por mês, ainda assim uma vez que temos 2,2 milhões de pessoas acima dos 65 anos, e 140 mil profissionais de saúde, pode demorar pelo menos 5 meses só para vacinar esses dois grupos fundamentais.
A esse ritmo, só cerca de 30 % da população ficará vacinada no primeiro semestre, após o início da vacinação. Ora como são precisos cerca de 65% da população vacinada, para atingir a imunidade de grupo, poderá levar um ano até que isso possa ser atingido.
Como possível complicação não sabemos ainda se a eficácia da vacina dura pelo menos um ano, porque se durar menos, então o processo ainda levara mais tempo, dado que se tem de re-administrar a vacina mais frequentemente aos grupos de risco.

MH: Considera que as medidas tomadas pelo governo, principalmente nesta segunda vaga têm sido acertadas? Se estivesse na “pele” da Ministra da Saúde e até do Primeiro-ministro, que medidas tomava?

PC: O primeiro-ministro, a ministra da saúde, e francamente todo o governo, já se revelaram estarem mais interessados em propaganda política do que em medidas acertadas, um pouco ao estilo que já referi do governo russo, mas pior, porque esse, conseguiu pôr o seu pais a desenvolver duas vacinas.
O governo tem sido bastante incompetente para conter a infeção e salvar, na primeira vaga, quer vidas, quer a economia, tal como o são agora na segunda vaga.
Na saúde, estamos já de novo entre os 10 piores países europeus com maiores casos per capita.
Na economia, somos o sexto pior pais mais afectado pela pandemia, com um “crescimento” negativo de mais de 4% do PIB e como sabemos, por exemplo, já com imensas empresas de restauração completamente falidas.
Na primeira vaga, em Abril de 2020, perante toda a propaganda governamental e presidencial ridícula e irresponsável, que alardeava “milagre”, comparavam o nosso número de casos e mortos, em valores absolutos, com países de dimensões muito maiores que as nossas, em vez de per capita (por milhão ou por 100 000 habitantes), como deve ser feito.
Alertei e expliquei no artigo mais popular e partilhado de sempre do jornal Observador, que estávamos entre os 10 piores países em números de mortos per capita e devíamos tomar medidas sérias.
Em vez disto, o governo deu maus exemplos e foi irresponsável e incoerente. Não liderou desde o início, por exemplo, logo a 25 de Abril, permitindo um grande ajuntamento na Assembleia da República enquanto exigia aos portugueses confinamentos estritos.
Nem perante a evidência de ter sido colocado nas listas negras de quarentena da maior parte dos outros países europeus, asfixiando o nosso turismo, mudou de comportamento.
Continuou a negar a realidade da gravidade da situação, ofendendo e hostilizando parceiros turísticos tão importantes como a Inglaterra, sem dar explicações simples, nem tomar medidas coerentes, ou mesmo fazer planos sérios para precaver uma segunda vaga, tendo passado o verão a tentar explicar a grande exceção da Festa do Avante ou, pior.
Sinceramente durante o verão deu-me a ideia de um governo a tocar piano, músicas sobre os interesses do costume, enquanto o Titanic se afundava, ou seja, um governo entretido com coisas mirabolantes, com que mais nenhum governo europeu estava preocupado nessa altura, como planear o investimento de 7 milhares de milhões de euros no hidrogénio, ou 1000 milhões para, no meio de pandemia, ser a única entidade do mundo – para nem falar de único governo – a comprar a maioria das ações de uma companhia de aviação falida, quando devia era estar absolutamente focado em salvar vidas e as centenas de milhares de empresas afetadas pela pandemia.
Entre Julho e Outubro, mesmo antes da curva severa desta segunda vaga, apesar da quarentena, consegui vir a Portugal no mesmo período em que fui também à Grécia e ao Chipre. Foi vergonhoso para mim ver o cuidado e detalhe com que estes dois últimos governos exigiam dados eletrónicos e testes de Covid-19, antes de voar e depois de chegar, em contraste com a ausência de critérios e leviandade com que o governo português permitia a entrada, sem controlar nada, nem sequer recolher as formas de localização do passageiro pela DGS.
Em relação às medidas que tomaria, ou recomendaria ao governo, primeiro e acima de tudo, seria liderar. Por exemplo, inspirando confiança na população, praticando sempre aquilo que recomendou ou exigiu aos outros, sem exceções para o próprio ou amigos, como as que assistimos, incrédulos, no 25 de Abril, 1º de Maio, Comédia no Campo Pequeno, Avante, manifestações sobre um caso americano, ou Fórmula 1, entre vários outros enormes exemplos onde, infelizmente, o governo perdeu o respeito de muitos portugueses que, perante isso, não entendiam porque tinham que encerrar estabelecimentos, destruindo empresas que demoraram uma vida a construir. Não vi tantas exceções e tantos maus exemplos de um outro governo em toda a Europa.
Segundo, além de economistas, debater profundamente os prós e contras de cada medida restritiva, com verdadeiros especialistas nacionais e mundiais de epidemiologia e outras disciplinas de saúde pública, antes de anunciar as medidas à população de forma simples e direta.
Isso teria permitido ao governo anunciar, em vez de às “três pancadas” e em cima do joelho, com calma, serenidade e devida antecedência, medidas previamente estudadas para serem coerentes e eficazes, em vez de contraproducentes como anunciar, num sábado de madrugada, medidas logo contraditas pela realidade ou pior perigosas e que levam à concentração das pessoas a certas horas em vez de diluição no tempo.
Além das enormes contradições e total ausência de capacidade de comunicação e implementação consistente e eficaz de medidas pelo primeiro-ministro, ministra da saúde ou DGS, fiquei ainda mais espantado em ver uma ministra em nada qualificada em saúde (escolhida para o governo sobretudo por ser filha de outro ministro amigo de Costa), ser porta-voz sobre medidas de confinamento do governo, lançando ainda mais confusão e incerteza.
Em relação a medidas adicionais, além do maior rigor e cuidado com as medidas de confinamento, implementaria um controlo mais rigoroso dos aeroportos, dos transportes públicos e dos eventos públicos permitidos.
Para ganhar aliados nos períodos de não circulação, teria investido mais em apoios as empresas afetadas como as da restauração e espetáculos, em vez de nos interesses do costume onde se continuaram a gastar milhares de milhões em vez de na saúde, mesmo no meio de uma pandemia.
Só o governo Português se preocupou com mais do mesmo em vez de priorizar por completo as medidas na saúde e na economia.
Teria também proposto a redução dos salários dos membros do governo e dos seus cerca de 12000 assessores e outros nomeados pelo governo, como forma de solidariedade e empatia com as centenas de milhares de portugueses que perderam o seu emprego durante a pandemia.
Se alguns desses assessores ou nomeados, na maioria sem qualquer qualificação técnica ou experiencia profissional de monta, a não ser fidelidade acéfala à direção partidária de Costa, incluindo no ministério da saúde, não gostassem dessa medida, tê-los ia convidado a sair e aproveitar para contratar especialistas com capacidade e experiência profissional de topo para gerir e lidar com uma pandemia.
Assim teria, por exemplo, uma base de dados da DGS fiável em vez de inviável e cheia de erros, ou uma aplicação para telemóvel útil em vez de inútil e com tentativa de imposição à força.
Substituiria, sempre que possível, medidas restritivas e confinamentos por mais testes e acessibilidade aos testes e seus resultados, em vez de longos isolamentos.
Outras medidas fundamentais seriam, alocar o maior número de recursos possíveis para proteção dos lares de idosos, bem com negociar com os hospitais privados para que, neste período crucial, a sua capacidade fosse usada pelo SNS, quer para doentes Covid-19, quer para as outras doenças, incluindo rastreio e cirurgias, descuradas em hospitais públicos, sobrecarregados com Covid-19.
Teria também incentivado e estabelecido parcerias com as dezenas de companhias farmacêuticas mundiais a desenvolver as vacinas e os medicamentos que aqui discutimos, para atrair essas terapias de vanguarda para os nossos doentes mais graves. Simultaneamente aproveitar a oportunidade única de fazer o pais avançar pragmaticamente nos ensaios clínicos e desenvolvimento terapêutico, catalisando um ecossistema favorável (para finalmente aproveitarmos os enormes recursos humanos que temos na área da saúde por todo o mundo), incentivando ao regresso dos muitos profissionais no estrangeiro, incluindo enfermeiros e técnicos de saúde.
Esse era o único grande investimento que me pareceria legitimo e oportuno numa altura destas, não andar a gastar, como de costume, nos mesmos do costume.
Teria também um plano de vacinação pronto, com táticas bem estudadas e discutidas para suportar objetivos concretos, para sermos dos primeiros e mais rápidos países a vacinar a população.

MH: Acha que as autarquias e as políticas de proximidade poderiam ter um papel mais importante, sendo mesmo fulcrais para o controlo da Pandemia?

PC: Sim, finalmente a DGS vai fornecer publicamente os dados da COvid-19 por concelho como tenho sugerido desde Abril.
Quantificar em cada concelho é crucial para saber alocar os recursos finitos do ministério da saúde conforme as necessidades e gravidade da situação em cada concelho.
Seria importante dar poder e recursos as autarquias para lidarem com a pandemia no controlo da pandemia, no terreno e em contacto próximo com a população.
Não entendo, por exemplo, como em vez de 1500 milhões para as PPPs rodoviárias, quando vários economistas dizem que só deveriam ser 300 milhões, esse dinheiro adicional não foi melhor alavancando pelo governo para ajudar as autarquias para enfrentarem a situação mais dramática de uma geração inteira.

MH: O Doutor Pedro Caetano, apesar de crítico, como sabemos é da família política do actual governo. Consideraria um convite para Ministro da Saúde, ou mesmo a substituição de Graça Freitas no SNS? Estava pronto para assumir um “chamamento do país”?

PC: Eu não sou crítico da família política do atual governo, mas das famílias da política no atual governo!
Começo por brincar um pouco com a sua pergunta, antes de passar ao problema muito sério da falta de liderança e competência em todo o ministério da saúde.
Como António Costa, tal como Trump, é tão ou mais autoritário e incapaz de receber críticas ou ouvir especialistas qualificados que o questionem, provavelmente, numa posição dessas, eu seria tão hostilizado por Costa como Trump tem feito ao meu herói da saúde pública, Anthony Fauci, diretor do instituto de doenças infeciosas (risos)
Falando seriamente, vários profissionais portugueses altamente qualificados e com sucesso internacional na área da saúde estaríamos prontos para servir o pais numa altura tão crucial como a que temos enfrentado.
Aliás durante a direção de António José Seguro no PS, fiz parte de um grupo de profissionais exatamente assim, vindos de companhias privadas ou das melhores universidades e hospitais nacionais e mundiais, que durante três anos, voluntariamente e sem qualquer renumeração, estudamos a fundo como melhorar o SNS e proteger os nossos doentes.
Íamos, por exemplo, sem qualquer aviso, às 3 ou 4 da manhã, verificar como estavam a funcionar as urgências ou denunciando, sem medo, os casos de má gestão, falta de qualificação, corrupção ou desvio ilícito dos recursos do SNS.
O problema é que com o “golpe” de Costa e dos Jotas partidários de meia idade da atual direção do PS, contra a honestidade e integridade de Seguro, do género do João Galamba, esse grupo foi de imediato substituído por gente como a já aqui referida ministra, por ser filha de um ministro, sem qualquer qualificação em saúde.
No geral, com algumas exceções claras, quer na saúde quer na proteção civil, António Costa e esta direção do PS, não escolhe membros do governo (incluindo quando estão em jogo muitas vidas de portugueses), com base na integridade, honestidade, mérito, qualificação, competências técnicas, experiência profissional ou resultados passados.
Os critérios de escolha para o atual governo, incluindo no ministério da saúde são muito diferentes e francamente aterradores.
Estes passam largamente pela predileção por gente pouco qualificada, ligada no passado à juventude partidária, totalmente dependente da política ou do estado, logo sem qualquer capacidade técnica e/ou de independência económica e profissional para poderem sequer questionar as decisões do primeiro-ministro ou dos outros ministros, fraquíssimos, vindos das juventudes partidárias.
Mesmo numa altura destas em que tantos portugueses estão a perder a vida, conheço pessoalmente casos e são aliás noticiados na comunicação social, de ex-membros da juventude partidária, sem qualquer qualificação em saúde ou gestão, nomeados para dirigirem grandes hospitais. Que resultados esperar de um sistema assim senão dos piores da Europa?
É por isso e por estar rodeada de gente assim que penso que até uma médica qualificada em saúde pública e simpática como a Dra. Graça Freitas, contra a qual nada tenho, tendo alias colaborado com a DGS quando ela era vice-presidente da mesma e eu professor de farmacologia e epidemiologia na Faculdade de Medicina da Nova, está condicionada para repetir todos os disparates e contradições que este governo lhe transmita, sem permitir qualquer contraditório ou pensamento próprio forte.

MH: Na sua opinião haverá uma terceira vaga?

PC: Acredito que, se tudo o que aqui descrevi sobre a vacina se confirmar, dentro de um ano ou até mesmo meses, podemos atingir a imunidade de grupo contra a covid-19.
Além disso a partir do momento em que vacinarmos grande parte da população mais idosa, desceremos sem dúvida significativamente a taxa de letalidade do vírus, mesmo se não descermos tanto a taxa de infeção, tornando a pandemia menos grave.
No entanto, dado o problema que referi da eficiência na distribuição da vacina, poderá ainda acontecer uma terceira vaga, em países que não sejam rápidos na vacinação dos grupos prioritários e que, com medidas incongruentes e demasiadas exceções, já tenham exaurido a paciência de largos sectores da população para obedecerem a mais medidas restritivas, sem subterfúgios criativos ou revolução aberta como já se passa na restauração.
Portugal, por não ter ainda plano de vacinação, pelos seus governantes nem sempre darem o exemplo, nem ajudarem os sectores mais afetados, é um dos países europeus que corre agora mais risco de uma terceira vaga, mesmo quando estamos tão perto de ter uma vacina.

MH: Como será o “day after” da Covid-19?

PC: Muita coisa não voltará a ser como dantes e isso não é necessariamente mau.
Por exemplo de ora adiante, acredito que medidas como higienização das mãos, cuidado no toque do rosto, máscara nos transportes ou em eventos com muita gente, e um maior cuidado na distância social, vieram para ficar e tornar-se hábitos saudáveis.
Portanto ficaremos mais precavidos e menos permeáveis à contaminação por outros possíveis vírus ou bactérias. Também a nível de rapidez de desenvolvimento clínico de vacinas, demos um salto gigantesco.
Penso que tão depressa, mesmo que apareça outro vírus complicado, não vamos ficar tanto tempo como desta vez “descalços” sem testes, medicamentes ou vacinas.
Creio também que as pessoas não vão voltar a viajar tanto por motivos profissionais porque vão continuar a valorizar as muitas opções digitais para congressos ou trabalhar de casa. Por outro lado, acho que as viagens por lazer vão ressurgir em força e que vamos valorizar ainda mais estar perto, fisicamente, dos amigos e família.
Se as coisas forem bem negociadas com países da união europeia e outros, por um governo mais competente que o atual, muitos dos 3 milhões de Portugueses que agora trabalham e vivem no estrangeiro, pagando lá parte dos impostos, podem regressar a Portugal, mantendo os seus empregos no estrangeiro, trabalhando remotamente.
A economia Portuguesa pode até sofrer uma grande revitalização. É uma oportunidade única, mas possível.

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Comentários (2)

  • Marcos goes Responder

    Ótimo trabalho!
    Após perder muito tempo na internet encontrei esse blog
    que tinha o que tanto procurava.
    Parabéns pelo texto e conteúdo, temos que ter mais
    artigos deste tipo na internet.
    Gostei muito.
    Meu muito obrigado!!!

    24 de Novembro, 2020 a 13:14
  • Clinica de Reabilitação RJ Responder

    Olá, somos da Clinica Vitta e gostariamos de fornecermos
    materia para vocês, e/ou receber material para colocarmos
    em nosso site. Por favor, entrar em contato.
    www.clinicavitta.org

    25 de Novembro, 2020 a 10:25

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