«A nossa sociedade está a saber reinventar-se»
Vereadora com os Pelouros da Saúde e da Educação, Emília Santos, enfrenta uma pandemia que dura há mais de um ano e meio e que obrigou à reinvenção dos Pelouros que gere. Em entrevista ao Maia Hoje, falou sobre os desafios impostos pela Covid-19.
Há quatro anos deixou as funções de deputada à Assembleia da República para abraçar projetos desafiantes na terra que a viu nascer. A terminar o mandato, faz um balanço sobre os desafios impostos pela pandemia, que a obrigaram a «gerir para muitas pessoas». Depois de tudo isto, Emília Santos acredita que «a nossa sociedade não será igual, mas que está a saber reinventar-se» e que «o impacto da pandemia vai exigir que o poder local faça um ajustamento das políticas locais a este novo ciclo».
Maia Hoje (MH) – Como é que se lida, ao longo destes quatro anos, com grandes desafios, tendo em conta que ninguém previa a chegada de uma pandemia, que já se estende há mais de um ano e meio, e que obrigou a uma readaptação de programas, quer na Saúde, como na Educação?
Emília Santos (ES) – Sinceramente, não tenho tido tempo para pensar nisso. Quando assumimos este compromisso, que é um compromisso público, nunca sabemos o que é que nos vais aparecer pela frente. Efetivamente, assumi competências em dois pelouros, para além de empresas municipais em que tenho responsabilidades de administração sem remuneração. A Educação e a Saúde são pelouros de grande dimensão emocional, mas, nunca imaginei que fosse colocada à prova deste grande desafio. Numa situação de grande adversidade, em que tivémos todos de nos reinventar, tivémos também de de reinventar as respostas na educação e muito mais as respostas na saúde. As Câmaras Municipais e as Juntas de Freguesia, muitas vezes assumiram responsabilidades que não eram suas porque as pessoas estavam a necessitar delas e o Estado não conseguia fazê-lo sozinho. Se há coisa que esta pandemia já provou é a urgente necessidade de uma reforma do Estado que aproxime o poder das pessoas.
MH – O que é, afinal, gerir para muitas pessoas?
ES – Gerir para muitas pessoas é gerir emoções e afetos porque temos que fazer opções. Em tempo de pandemia, tudo isto é duplicado, não só temos que gerir as emoções das Pessoas, de saber ouvi-las, de as entender e de as ajudar a resolver os seus problemas, como tenho que gerir as minhas emoções, as que levo para casa porque os problemas não podem ficar sem solução. Não consigo desligar, não consigo relaxar e deixar de pensar nos problemas e em como os resolver quando saio da Câmara. Não consigo ir embora, sabendo que há uma fila de pessoas para vacinar. Ainda que eu não possa fazer muito para além do que são as competências que o Poder Local tem, procuro sempre soluções nesse quadro e fora dele, naquele que pode ser feito por todos nós, não consigo virar as costas, o que me obriga a fazer uma gestão das minhas emoções.
MH – Que lições tem tirado destes últimos quatro anos de serviço público na Maia?
ES – Tenho aprendido muito com os Maiatos, com quem falo diariamente e com as pessoas com quem trabalho. Todos têm-me dado lições de grande força, humanismo e solidariedade. São as pessoas que me têm colocado à prova. Falo das Maiatas e Maiatos, dos profissionais de saúde e dos voluntários, tantas vezes esquecidos. Quando falamos de estar na linha da frente, também estamos a falar dos assistentes operacionais, assistentes técnicos e animadores das escolas, que ao fim de semana vão para o Centro de Vacinação e que estiveram sempre disponíveis para tudo, inclusive no Centro de Acolhimento para pessoas com COVID-19, que funcionou com todas as condições num hotel do centro da cidade, e foi muito importante para apoiar os lares no inicio da pandemia e no Centro de Apoio a pessoas que testaram negativo à COVID19 mas não tinham retaguarda familiar. Todas estas pessoas, colaboradores e voluntários do município, constituem uma grande equipa que deram, e continuam a dar, tudo de si, desde o início da pandemia, num tempo em que tudo era desconhecido e, sem medo, disponibilizaram-se. Deram o passo em frente. Não sei se sabiam o risco que corriam mas a verdade é que, independentemente de saberem ou não, puseram outros valores à frente. Isto é de uma grande humanidade. Não tenho dúvidas que os Maiatos lhes estarão para sempre gratos. Por isso eu digo que, neste período, fiz uma grande gestão de emoções e afetos e aprendi muito com todos, mas também tive um grande crescimento pessoal. Regressei de Lisboa, onde exerci funções de deputada à Assembleia da República, onde tive sobretudo funções legislativas. Aprendi que qualquer problema deve ter soluções, mas é no terreno, quando estamos a trabalhar a nível local e quando os problemas se sucedem que temos de encontrar sempre uma solução adequada para o bem das pessoas.
MH – Como é que gostava que fosse o futuro próximo?
ES – É tão difícil de responder a essa pergunta pela incerteza que vivemos. Já sabemos que a ciência nos forneceu uma arma poderosíssima no combate a esta pandemia, que são as vacinas. Já sabemos que funcionam, mas enquanto não se alcançar a imunidade de grupo no mundo inteiro há sempre incerteza e o risco do aparecimento de novas variantes é permanente. Como disse recentemente o Senhor Presidente da Câmara Municipal, todos gostávamos de navegar em águas calmas mas a realidade é a que é, e é neste contexto que temos de continuar a trabalhar. A pensar no bem dos Maiatos, a resolver os problemas que surgem no dia-a-dia para que tudo corra bem e a preparar o fururo. Respondendo à sua pergunta, no domínio da saúde e no que diz respeito à pandemia já estivemos muito pior mas também já estivemos melhor, por isso gostava que não piorasse para que este grande esforço de vacinação que está a ser feito não se perca e, daqui a algumas semanas, seja possível atingirmos uma elevada cobertura de pessoas vacinadas na Maia para, podermos ir regressando a uma normalidade cada vez mais próxima da realidade que vivemos antes da pandemia. Na área da educação os desafios também são muitos. Mas, a sabedoria popular costuma dizer que “O futuro a Deus pertence”. Apesar das dificuldades a sociedade está a saber reinventar-se. A minha convicção é que o futuro trará novos desafios, como por exemplo a descentralização de competências. Portanto, o que ambiciono é que a Maia, no próximo mandato, possa replicar aquilo que já fazemos agora no primeiro ciclo, em todos os outros níveis de ensino, o que é um enorme desafio, que implica a gestão de muitas pessoas e de um grande orçamento. Se neste momento, 60% do orçamento municipal já é para as funções sociais, que integra a educação, a saúde e a habitação, com a descentralização de competências, o orçamento terá forçosamente um aumento considerável nestas áreas, que são muito importantes para a qualidade de vida das Pessoas.
MH – Que impacto acredita que esta pandemia, que já vai longa, poderá trazer, a nível local, quer para o município, quer para os maiatos?
ES – Nada será igual, mas como já disse, a sociedade está a saber reinventar-se, a ajustar-se a esta nova realidade. O impacto da pandemia vai exigir que o poder local faça um ajustamento das políticas locais a este novo ciclo. Tem que haver um ajustamento, não podemos fazer de conta que isto foi uma coisa passageira e que vai continuar tudo igual, porque não vai. O mundo não vai ser igual. As pessoas e as empresas estão a passar por muitas dificuldades. Existem assimetrias muito grandes, que precisam e vão demorar para ser combatidas. Vão precisar de muito apoio e, numa altura em que se fala muito em descentralização de competências, o poder local também vai ter que se reinventar para conseguir dar resposta às necessidades das famílias, da economia, da sociedade no seu todo. Esse vai ser o grande desafio do futuro, e os autarcas deverão assumir um papel muito importante, porque é sempre nas autarquias que as pessoas procuram encontrar soluções para os seus problemas, o que é natural, porque é o poder do Estado que está mais próximo delas. Com a descentralização de competências é necessário que o Estado envie também as verbas necessárias para que essas competências possam ser assumidas com a qualidade a que as Maiatas e Maiatos estão habituados, que é a melhor. Fazer as Pessoas felizes é a nossa ambição e revejo-me totalmente nesse desígnio, nunca esquecendo que trabalhar com pessoas e para as pessoas em tempo de pandemia é, também, gerir afetos e emoções. Fazemos isso todos os dias.
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